"Na Positive Ventures, investimos em algumas soluções que contribuem para trazer transparência e eficiência a projetos de reflorestamento e captura de carbono, como a Pachama e Funga."
1. Qual é a sua formação e experiência em soluções baseadas na natureza (SBN)?
Minha trajetória até agora foi pautada na posição de analista e investidora. Comecei minha carreira no mercado financeiro tradicional, com análise de empresas brasileiras listadas na bolsa, e nos últimos dois anos me juntei ao time de investimentos da Positive Ventures, um fundo de Venture Capital focado em investimentos de impacto.
Há alguns anos, comecei a estudar de forma mais aprofundada sobre as mudanças climáticas, impulsionado por um interesse pessoal e aumento da relevância do tema. Neste primeiro momento, o objetivo era entender melhor os riscos relacionados a mudanças climáticas e, consequentemente, possíveis oportunidades para investimento. À medida que fui estudando mais o assunto, entendendo as principais causas e impactos para o planeta e população, fui me envolvendo cada vez mais com o desafio climático. Porém, até esse momento, de forma mais distante e reflexiva.
Minha jornada com Soluções Baseadas na Natureza (SBN) começou, de forma consciente e estruturada, na Positive Ventures, por se encaixar perfeitamente com a nossa tese de investimentos. À medida que analisava algumas empresas de SBN, comecei a estudar de forma mais aprofundada nas dinâmicas do mercado e seus principais agentes.
2. Como você descreveria a proposta de valor da sua organização para alguém novo no setor?
A Positive Ventures é uma gestora focada em investimentos de impacto em estágios iniciais, mobilizando capital para empreendedores que estão construindo soluções inovadoras para os principais desafios sociais e ambientais da atualidade. Nossa tese de investimentos consiste em se associar a um time excepcional com intencionalidade de impacto, combinado com uma abordagem empreendedora e tecnológica.
Acreditamos que o poder do investimento de impacto reside na capacidade de influenciar positivamente o meio em que vivemos para muito além do universo investidor-investida: emprestar um valor social e/ou ambiental para o capital que alocamos é relevante, e entendemos que estamos contribuindo para o ecossistema de impacto como um todo.
Em termos de escopo, buscamos fazer investimentos decisivos que atacam dois desafios com clara sobreposição entre impacto e oportunidades de mercado: (i) Prosperidade Planetária e (ii) Resiliência Social. Apesar de uma organização mental em dois principais pilares, estamos convencidos de que separar desafios sociais e ambientais é uma falsa dicotomia, afinal, populações socialmente vulneráveis sofrem primeiro e de forma desproporcional os efeitos das mudanças climáticas.
Nesse sentido, quando olhamos para desafios como mudanças climáticas e a crescente perda da biodiversidade, soluções baseadas na natureza são imprescindíveis. Na Positive Ventures, investimos em algumas soluções que contribuem para trazer transparência e eficiência a projetos de reflorestamento e captura de carbono, como a Pachama e Funga. Entendemos que a preservação de uma floresta é crucial não somente para evitar desmatamento e emissões, mas também para preservar a biodiversidade local, manter o clima natural da região e garantir funções sociais e econômicas da população local.
3. Quais são os números ou insights de mercado que mais te animam no espaço de SBN?
Embora muitas abordagens de remoção de carbono projetadas tenham o potencial de remover bilhões de toneladas de CO2 por ano da atmosfera (e.g. enhanced rock weathering, direct air capture), a maioria delas não está comercialmente pronta hoje ou até o momento, alcançou apenas dezenas de milhares de toneladas de remoção por ano.
Hoje, a alternativa mais economicamente viável e abrangente para a remoção de carbono ainda são as soluções baseadas na natureza. Os sistemas naturais, como solos, florestas, pastagens e oceanos, atuam como "reservas de carbono", cruciais para equilibrar o desafio climático global. Um estudo publicado pela Nature em 2021 estima que soluções baseadas na natureza podem mitigar até 10 Gt CO2 por ano globalmente.
Neste contexto, o Brasil oferece um grande potencial para trazer soluções de mitigação e remoção de carbono - por exemplo, as florestas na América Latina crescem, em média, 2x mais do que no resto do mundo. Estamos muito empolgados em investir e apoiar empresas que estão trazendo soluções inovadoras para esse desafio, implementando suas soluções no país. Em especial, as metas de reflorestamento são muito ambiciosas para os próximos anos, e para alcançá-las, vamos precisar não somente de desenvolvedores de projetos de reflorestamento, mas também ferramentas para trazer eficiência e transparência para este processo acontecer no prazo, na escala e com o impacto necessário.
4. Quais são as principais dificuldades ou travas que, se resolvidas, podem e têm contribuído para o crescimento das SBN?
Enxergo hoje dois principais pontos que são um gargalo para o crescimento da SBN no Brasil: i) regulamentação e ii) acesso a capital.
Em relação ao primeiro, o Brasil está bem atrás de outros países em termos de agenda regulatória para mudanças climáticas. As discussões para um mercado brasileiro regulado ainda estão iminentes, mas têm um grande potencial para destravar uma demanda por créditos de carbono e, consequentemente, projetos de reflorestamento, entre outras possibilidades. Além disso, é preciso criar uma agenda regulatória para eliminar barreiras burocráticas para o desenvolvimento de novos projetos e trazer incentivos financeiros ao setor, como forma de estimular o mercado.
O segundo ponto, acesso ao capital, é tão importante quanto o primeiro desafio. Em parte, o fluxo de capital deve aumentar com maior regulamentação e incentivos econômicos, mas existe um trabalho de advocacy de trazer o tema para os holofotes. Além de certo ceticismo, hoje o acesso a investidores para alocar seu capital em projetos SBN são muito restritos, se não inexistentes. É preciso criar mecanismos para possibilitar maior acesso a esses produtos.
5. Você pode ajudar a esclarecer ou contextualizar uma palavra/conceito no espaço SBN que você acha que é frequentemente mal compreendido?
Soluções baseadas na natureza são importantes não somente para mitigação de carbono, mas também para adaptação. Com a escalada da crise climática e o objetivo comum de manter as temperaturas globais abaixo de um aumento de 1,5˚C, os holofotes acabam indo para as soluções de mitigação com o objetivo de reduzir e remover o carbono da atmosfera.
Porém, é importante reconhecer que já estamos vivendo num planeta mais quente e sofrendo o impacto dos eventos climáticos extremos cada vez mais frequentes. Diante desse cenário, soluções baseadas na natureza em adaptação são igualmente importantes para nos ajudar a limitar os impactos negativos das mudanças climáticas hoje. Por exemplo, manter a floresta na margem de rios ou evitar desmatamento em regiões áridas são práticas importantes para evitar alagamentos e incêndios, respectivamente.
6. O que você gostaria de compartilhar com a comunidade NatureHub Brasil?
Como um fundo de venture capital de impacto com grande foco em clima, um dos nossos desafios é encontrar empreendedores nesse setor no Brasil. Enquanto vemos o tema de startups em clima ganhando relevância em conferências de inovação nos Estados Unidos e Europa, ainda são poucos os casos que encontramos hoje no Brasil.
Entendemos que existem inúmeros empreendedores talentosos e experientes que poderiam criar soluções nesse setor, que historicamente recebeu pouca atenção e visibilidade quando comparado a outros segmentos, como fintechs e healthtechs. Dito isso, entendemos que projetos de aceleração e de grants são ferramentas importantes para estimular o desenvolvimento desse ecossistema. Paralelamente, queremos motivar pessoas engajadas a empreenderem em clima, criando soluções inovadoras para impulsionar nosso esforço em conter as mudanças climáticas nos próximos anos.
Sensacional!